30 de junho de 2016

RESENHA: SANDMAN – NOITES SEM FIM

Perpétuos da esq. p/ dir.: Delirium, Morte, Destruição, Sonho, Destino, Desejo e Desespero.

Sandman é um dos quadrinhos mais conceituados da história dessa mídia. Entre a legião de fãs temos nomes como Stephen King e Claire Danes, mas o mais incrível feito do título é ter lançado o nome do autor Neil Gaiman em escala mundial.


“Ergamos um brinde aos amigos ausentes, amores perdidos, velhos deuses e à Estação das Brumas, e que cada um de nós sempre conceda ao diabo o que lhe é merecido” – Neil Gaiman


Sandman nos conta a história do perpétuo, Sonho, também chamado de Morpheus, o senhor do Sonhar. Sonho (Dream) é um dos sete perpétuos, seus irmãos são o Destino (Destiny), Desejo (Desire), Desespero (Despair), Delirium (Que já foi Deleite, ou Delight), Destruição (Destruction) e por fim, a Morte (Death). Essa antropomorfização de conceitos e ideias é a marca registrada de Neil Gaiman, vide Deuses Americanos, que é outra obra famosa dele, e com esse título, publicado pela Vertigo, que é um selo da DC Comics, Gaiman foi capaz de misturar mitologia e um pouco de horror ao universo da editora, na verdade é até um pouco estranho pensar que o Sonho e seus irmãos habitam na mesma realidade que a Liga da Justiça.

 Sandman – Noites Sem Fim foi o primeiro quadrinho da história a entrar para lista de livros mais vendidos da New York Times. Essa edição foi publicada como um álbum gráfico e ficou marcado pela revisita de Neil Gaiman, depois de longos setes anos, a esse universo que ele criou. A obra é dividida em sete capítulos, um para cada perpétuo, cada parte é ilustrada por um artista famoso no meio da arte sequencial: P. Craig Russel (Morte), Milo Manara (Desejo), Miguelanxo Prado (Sonho), Barron Storey (Desespero), Bill Sienkiewicz (Delirium), Glenn Fabry (Destruição) e Frank Quitely (Destino), por fim Dave McKean integra o time sendo o responsável pelo design e pela capa do álbum.

O resultado desse trabalho é um encadernado de capa dura incrível, publicado e distribuído no Brasil pela Panini Comics, a edição brasileira contou com a excelente tradução de Jotapê Martins, que é um grande nome no cenário nacional de quadrinhos e fez um excelente trabalho traduzindo e adaptando a obra com o mínimo de perda cultural, o que é difícil tendo em vista o conteúdo da revista, que é bastante artístico e autoral.

Morte/Death
O primeiro capítulo, intitulado Morte e Veneza, nos conta a história sobre a relação entre a Morte e um dia de duzentos anos atrás, um dia que nunca termina. A Morte é a minha predileta entre os perpétuos, ao contrário do que se imagina, ela é a mais alto-astral e humana dos perpétuos, fazendo, durante a leitura, com que tenhamos um entendimento maior sobre a morte em nossas vidas, e por fim, acabamos amando a Morte, e como não amar, afinal, ela nos ama também. Seu visual se baseia na cantora de Punk Rock Susie Sioux, o que a deixou com uma cara bem gótica, toda essa mistura deixa a personagem extremamente carismática. A arte de P. Craig Russel é simples, mas bonita, ele faz um bom uso de paletas de cores diferenciadas para determinar e dar clima a cada tempo e ambiente retratado e serve bem à história, que trata um pouco de aventura, rebeldia, negação, mas, acima de tudo, fala de amor.

Desejo/Desire
O que Experimentei do Desejo conta uma história de amor, em que uma jovem em tempos imemoriais aprende tudo sobre Desejo, inclusive que conseguir o que se deseja não significa ser feliz. Desejo não é nem de longe um dos meus perpétuos favoritos, contudo, isso não quer dizer que ele seja desinteressante, Desejo é um ser de traços andróginos, justamente para representar a dualidade do desejo sexual, e além de ser o próprio desejo, ele tudo deseja, afinal, segundo o mesmo, “o que mais se pode querer?”. A arte desse capítulo é assinada por Milo Manara, acho uma escolha bem pensada, tendo em vista que Manara é famoso por seus quadrinhos eróticos, contudo, acho sua arte um pouco problemática pelo excesso de ícones fálicos, creio que esses ícones nada acrescentam para a história e deixam um leve incômodo presente na leitura do capítulo.

Sonho/Dream (Esq.) e Killalla do Fulgor (Dir.)
Aqui temos Killalla começando a explorar a energia verde
O capítulo seguinte é O Coração de uma Estrela, essa história nos mostra a aurora do nosso universo, quando os sóis falavam e os perpétuos ainda eram jovens. Sonho é quem nomeia o título, ele é um personagem bem bacana por ser mais interessado nos mortais, por amá-los e lhes dar esperança, contudo, apesar dele ser esperança, Sonho é um tanto melancólico e foi muito rígido, até um pouco perverso eu diria, em sua juventude, mas outra coisa que o diferencia de seus irmãos é o fato de que ele aprende com seus erros e muda com o passar das eras, se tornando mais ameno. Essa história nos traz Sonho como protagonista, contudo, a história principal não gira totalmente em torno dele, mas de sua amada Killalla do Fulgor, do planeta Oa, isso mesmo, o lar dos Lanternas Verdes. Esse capítulo também nos mostra a primeira Desespero e a Deleite muito antes de se tornar Delirium, além de se passar antes de Destruição rejeitar o que ele é. Miguelanxo Prado nos mostra aqui maravilhosas paisagens cósmicas muito bem pintadas, além de um traço fino no contorno de seus personagens, de fato trata-se de uma arte muito agradável aos olhos.

Desespero/Despair
Quinze Retratos de Desespero não é um quadrinho comum, ele não tem um enredo, mas reúne uma série de situações que retratam, por meio de figuras abstratas mescladas a textos, a Desespero em diversas situações no cotidiano dos seres humanos, desde o momento em que somos julgados por algo que não cometemos, até o momento que percebemos que toda a alegria se retirou de nossas vidas e deu lugar a ela, Desespero. A personagem figura como um dos perpétuos que eu mais gosto, ela pode não ter boa aparência, mas é extremamente interessante por ser magistralmente escrita por Gaiman e genialmente ilustrada por Barron Storey nessa história, que é a minha preferida do álbum. Considero a leitura desse capítulo algo obrigatório para qualquer um, independente de ser fã de quadrinhos, pois essa história transcende a mídia e toca os corações de maneira única.

Delirium
Em seguida temos a história de Delirium, Entrando trata de um resgate um tanto estranho, executado por uma equipe improvável. Delirium está entre minhas preferidas também, ao lado da Desespero (as duas personagens são bem próximas, inclusive) e da Morte, ela é a mais jovem dos perpétuos e quase sempre é deixada sob tutela de um de seus irmãos. O motivo de eu gostar tanto das histórias em que ela aparece é o fator de nonsense que ela traz consigo, não existe linearidade ou lógica que segure Delirium e isso é uma delícia, quase sempre suas histórias são uma explosão de cores e no fim, acho que a personagem acaba trazendo uma dose de esperança para os loucos e desajustados. Entrando, por meio da arte de Bill Sienkiewicz, conta uma história muito bonita, mas de leitura difícil já que tudo ali é maluco e delirante, você provavelmente vai precisar ler umas duas vezes para conseguir entender bem o que aconteceu e quem era quem ali, mas vale muito a pena por ser um jeito diferente de contar uma história, o uso das cores e diferentes tipografias expressam muito bem a atmosfera caótica do capítulo.

Destruição/Destruction
O penúltimo capítulo é o Na Península, que tem Destruição como protagonista. Aqui vemos um dado momento em que arqueólogos descobrem um campo de escavação bem confuso, por possuir artefatos do futuro ao invés do passado, a esta altura sabemos que Destruição e Delirium têm alguma relação com o lugar, mas que relação é essa você só saberá lendo o quadrinho. Destruição é um perpétuo interessante porque o mesmo abdicou de ser. Ele não só significa como é a própria destruição, contudo, não é isso que ele quer para si, em dado momento ele deixa seus irmãos e vem para a Terra conviver com os mortais e fugir de sua essência, mas isso não dá muito certo. A arte de Glenn Fabri não traz nenhum destaque, ela é simples, mas funcional, sem nenhuma característica que o distingue dos outros.

Destino/Destiny
Concluindo o álbum, temos Noites Sem Fim, história que retrata o mais velho dos perpétuos, Destino. O capítulo faz uma descrição de quem é e o que significa Destino, nos mostrando seus motivos e seus mistérios enquanto o personagem caminha pelos corredores e jardins de seu castelo. Destino é tão misterioso quanto deve ser, nem ele mesmo sabe tudo que ele significa, ele vive acorrentado a um livro onde está escrito tudo que foi, é e será, mas não pode lê-lo, pois é cego. Gosto bastante do personagem, gosto de ouvir o que ele tem a dizer e gosto de suas conversas com a Morte. A arte de Quitely é muito bonita e traz a neutralidade do Destino em seus tons pasteis, vale notar a tipografia que lembra a de livros antigos, como se estivéssemos tendo acesso a uma pequena parte do livro que o personagem carrega, enfim, o capítulo conclui bem o álbum nos mostrando que Destino continua seguindo em frente, levando o universo nas mãos.


Sandman – Noites Sem Fim é um clássico e merece ser lido por todos, o álbum é uma verdadeira obra de arte que transcende qualquer guerra civil ou outra história de heróis se batendo ou batendo em vilões. Leia!


24 de maio de 2016

QUE PAÍS É ESTE? #2 - A CORRUPÇÃO

PARTE I - A CORRUPÇÃO COMO TEATRO OU CORTINA DE FUMAÇA

Na introdução a esta série de textos eu usei a analogia do teatro. Poderia usar também a de cortina de fumaça.

Uma cortina de fumaça não é algo que não existe, mas é algo que não tem fim em si mesmo. É só um disfarce pra acobertar algo. E é um instrumento de ilusão, fuga e direcionamento. Pensemos num ninja usando uma bomba de fumaça. Você se preocuparia com a fumaça ou com o ninja que a lançou?

Não se interroga a fumaça, mas o ninja que a lançou, porque a fumaça não tem nada a dizer; no máximo, ela é um indício de que o ninja quer se esconder.

Da mesma maneira, o teatro não tem fim em si mesmo: ele pretende transmitir uma mensagem. Aí, devemos indagar não apenas a peça teatral, mas quem a produziu, com que intenções, para que público. Não se interrogam os personagens nem os elementos cenográficos do teatro, porque eles não têm voz própria; são criações.

É dessa maneira que eu proponho que investiguemos o fenômeno da corrupção, na ordem-do-dia em nosso país. Assim como uma cortina de fumaça, para mim, parece que a corrupção não é uma verdade absoluta, em si mesma, não é objeto unívoco, um dado "natural" da realidade; ela é um instrumento de ação política. E, assim como um teatro, ela visa a alguma coisa além de si mesma.

Isso significa dizer que a corrupção é ilusória e não existe, na realidade? Claro que não! Mas, embora ela exista, ela não é um autômato, não têm vida própria. Ela é, em primeiríssimo lugar, o discurso de alguém interessado numa mudança política – e, em segundo lugar, obra de alguém interessado em apropriar-se da riqueza pública. Vejam: a corrupção não é ela; ela é alguém. Foquemos no “alguém”, no interesse, na ação, na mudança.

Comecei esta série propondo também que a corrupção, ao contrário de ser um corpo estranho na política, FAZ PARTE DELA, É-LHE INERENTE, É UMA ENGRENAGEM DELA. Por trás da cortina do teatro, da cortina de fumaça, é esta a engrenagem que se oferece à nossa análise; é este o motor que devemos buscar compreender. A corrupção como dinâmica, como mecânica.

A princípio, ninguém, nem sequer os jornalistas e os cientistas políticos, entende a bagunça que se tornou o nosso cenário político, com tanto escândalo, tanta acusação, tanta delação premiada, tanta evidência, indício, prova, hipótese, possibilidade, achismo, opinião, desejo, projeto. Neste momento, eu acho que a filosofia, por seu ritmo mais lento, pausado e reflexivo, pode nos ajudar a encontrar uma escapatória neste vendaval de ideias, acontecimentos e palavras. A filosofia nos distancia dos fatos imediatos, cotidianos, das notícias, mas se nós já não conseguimos acompanhá-las, parece-me útil fazer essa pausa e nos aprofundar para além das manchetes diárias.

Mas superemos a cortina. Olhemos através dela. Como ação, a corrupção tem começo (nos sentidos de início e de motivação), meio (nos sentidos de desenvolvimento e de modus operandi) e fim (no duplo sentido de término e de finalidade). Aí eu acho que as coisas começam a fazer sentido. E é isso o que eu procurarei mostrar daqui em diante, na primeira parte desta série de breves ensaios.

Por ora, limito-me a frisar uma implicância de compreender a corrupção como ação política: no quadro dela, entendendo-a não como um fenômeno estático mas como um movimento, na sua trajetória, uma investigação - isto é, o combate e o controle da corrupção - só vai até aonde o interessado em conduzi-la quer, e na direção, no encalço de quem ele quiser. Não existe inquisição imparcial. A investigação contra a corrupção é, digamos, o instrumento pelo qual a própria corrupção pode, paradoxalmente, cumprir sua finalidade, que é a de interferir na política e mudar o poder. Ela pode ser iniciada por qualquer um, inclusive por um corrupto, bem como pode ser obstruída, controlada, exaltada ou censurada por qualquer um, inclusive alguém honesto. Só assim, entendendo a corrupção como uma ação política, é que compreenderemos como corruptos podem se apresentar como paladinos morais combatendo a corrupção, ou como acusações podem atingir qualquer pessoa indiscriminadamente, misturando inocentes e culpados e confundindo a opinião pública.

Porque, se a corrupção é uma ferramenta para se atingir uma outra finalidade, qual seja, uma troca no poder, o condutor da investigação, corrupto ou honesto, só se preocupará em apresentar à opinião pública um herói e um vilão, pois é assim que ele induzirá o apoio ou a repulsa da população a seus inimigos ou aliados. O investigador, longe de ser imparcial, conduz o combate a partir de sua própria fé e filiação política, não de julgamentos divinos. Neste sentido, seu objetivo primeiro é mudar o poder, não, afinal de contas, corrigir ou eliminar a corrupção - até porque, se ele o fizer, neutralizará a ferramenta que ele próprio tem para interferir na política em benefício próprio e de seu partido.

Quer uma prova disso? Observe todas as operações da PF contra a corrupção no Brasil, especialmente as mais recentes e, sobretudo, a Lava-Jato. Conte quantas vezes elas culminaram em prisões e isolamentos políticos de fulanos e ciclanos e quantas vezes elas atingiram o essencial para o país e para o patrimônio público, que são as reformas políticas e legislativas (que previnam ao invés de remediar a corrupção) e a restituição ao tesouro público daquilo que supostamente foi roubado, desviado, superfaturado ou privatizado.

Mesmo quando as sentenças dos juízes comportam sugestões e medidas como essas, não são elas que vão ocupar os noticiários. Porque o investigador (com a cumplicidade de uma mídia que, no Brasil, está longe de ser democratizada) não está interessado em proteger o bem público e neutralizar a corrupção; ele está interessado em neutralizar um adversário político. Por isso prender o corrupto é mais importante do que recuperar a riqueza roubada. Especialmente porque sendo o corrupto também um político - não um ladrão que fugirá imediatamente para gastar o que roubou - ele permanecerá interferindo na política se não for preso e exposto ao escracho público e, sendo ele um rival, o investigador não pode permitir isso; ele precisa neutralizar o agente, não o ato. É preciso que o ato, a corrupção, continue sendo possível e viável, porque é por meio dela que qualquer grupo político tomará ou conservará o poder, e é em nome do combate a ela que os investigadores poderão, sempre, agir em prol de seus interesses e partidos.

Em suma, no funcionamento de nossa política, infelizmente, gostemos e aceitemos ou não, é preciso que os corruptos sejam eliminados, mas que a corrupção permaneça livre para ser praticada. Ela só virá à tona quando um dos grupos nela envolvidos, por algum motivo, romper com o pacto de silêncio que torna todos os corruptos cúmplices entre si. Porém, enquanto essa aliança permanecer, enquanto ela encobrir os atos que privatizam o bem público (que é a definição mais antiga, geral e fundamental de corrupção) e permitirem que cada partido retire o seu "pedaço do bolo", isto é, o seu próprio benefício da corrupção do Estado, o fenômeno persistirá.

Continuarei desenvolvendo esses pontos nesta parte desta série. Aqui, por enquanto, a minha sugestão conclusiva é, na verdade, uma pergunta provocativa: quando o silêncio se rompe, se são os próprios corruptos a conduzir as investigações e se eles se beneficiam da corrupção, quererão eles acabar com ela ou apenas expor os atos dos adversários, enquanto encobrem os seus próprios, como um ninja que lança uma fumaça para se esconder e se mover em silêncio?

Partirei daqui no próximo texto.


9 de março de 2016

[SPOILERS] Precisamos Falar Sobre A Quarta Temporada de House Of Cards [SPOILERS]

Gente, mais uma vez, ALERTA DE SPOILERS, LEIA POR SUA CONTA E RISCO! Comente com moderação.



Temporada após temporada, House Of Cards continua me surpreendendo, sempre quando acho que a história não tem mais pra onde ir e que tá ficando chato, vem aquele acontecimento que vira a mesa de novo e deixa as coisas interessantes.



7 de março de 2016

Que país é este? #1

É a “era da informação”. Somos bombardeados de informação.


Estamos todos conectados. É a “era da comunicação”.


A cada dia, nos jornais, um escândalo novo, uma nova operação da PF, um personagem novo. Não conseguimos montar sequer um quebra-cabeça com todas as peças que nos dão. Mas tudo bem: parece que nem a PF consegue.



Alguém se lembra de quem estava no banco dos réus há 3 meses? Qual era o teor da delação premiada de dezembro? Nem a PF se lembra.


Não importam os conteúdos, importam as performances. É tudo teatro. E na era da informação e da comunicação, o teatro é uma arma implacável.


Não está em jogo a corrupção; está em jogo o poder. Não interessa detetizar o Estado; interessa retomá-lo.


Recuperado o controle sobre o Estado, a corrupção não será abolida; ela será esquecida, escamoteada. De novo.


O teatro faz parecer que é tudo uma questão ética, de combate a vilões, que a solução está em tirar fulano ou ciclano do poder. A exploração exaustiva do argumento da corrupção forçosamente joga para o segundo plano as discussões que importam, fundamentais, crônicas: perto do protagonismo dado à Lava-Jato a Reforma Política, por exemplo, nem como coadjuvante aparece mais nos jornais e nas mesas de bar.


A cumplicidade da grande mídia com o teatro da corrupção inspira mais indignação que a própria corrupção. Porque se ela se tornou o 4º poder da República, que preze pelo mesmo valor que norteia os outros três: o progresso do país, não o conservadorismo. Se não se pode exigir dela (nem de ninguém) imparcialidade, esperamos dela, no mínimo, honestidade. Que as manchetes não sejam seletivas, que os crimes dos amigos não sejam acobertados (ainda bem que a internet nos deu imprensa independente!).


Já devíamos saber, mas parece que é preciso lembrar: não é que a corrupção, no Brasil, não exista; é que aqui ela não significa o mau uso do poder, aqui ela FAZ PARTE do poder. Ela SEMPRE foi parte INERENTE da política nacional. Sem ela, o sistema simplesmente NÃO funciona. Sem mensalões as câmaras legislativas não legislam. Sem loteamento dos cargos públicos e nepotismo coalizões NÃO são feitas. Sem desvio de dinheiro público obra alguma é executada. Sem enriquecimento ilícito projeto algum é aprovado.


Governabilidade: palavrinha mágica que, mesmo antipática, não pode ser ignorada. Ela é o coração da política. E a corrupção é o seu combustível.


O Estado é uma fonte de riquezas com as quais remunerar os aliados que garantem a governabilidade. Quem tem o Estado dá as cartas. Um partido apropriou-se dele e, há 13 anos, dá as cartas. Outros partidos estão cansados de se sentirem excluídos desse jogo ou de serem nele meros “decorativos” e querem dar eles próprios as cartas. Por que? Como? Com quais intenções? É isso o que precisamos discutir.


Controlar a massa é a chave pra vencer o jogo político. E é por isso que governar para ela é a maneira mais segura de manter o poder. Quem não quer fazer isso faz teatro e tenta entreter, distrair, manipular a massa. E, longe das câmeras, emprega a violência para controlá-la.


Mas para nós, massa, o que importa tudo o que os jornais noticiam sobre a corrupção? Nada! Não há esquemas sendo descobertos; há enredos, intrigas sendo criadas. Tomemos cuidado com o teatro.


O que podemos fazer, então, para escapar às táticas de controle?


Só consigo vislumbrar uma saída: esquecer o teatro e nos concentrar em nossas vidas. Ignorar a virtualidade das manchetes, sempre cheias de meias-verdades, de indícios dúbios tornados provas inquestionáveis, de delações “premiadas” (meu deus! Alguém consegue parar para pensar e perceber o quanto é perigosa essa ferramenta de investigação?), de fofocas, intrigas. E prestar atenção nos dados que nossas vidas nos oferecem. Tomar doses cavalares de realidade.

É isso o que eu tentarei fazer aqui, a partir deste texto: refletir sobre nossa política e sobre como seus elementos podem jogar com as nossas vidas.

2 de março de 2016

Devaneio Nerd #3: Você Já Abraçou Um Editor Hoje?


“Se a impressão é a arte negra, o design de livro pode ser a arte invisível.” – Richard Hendel

Ultimamente ando pensando bastante no produto livro, sempre gostei de ler, nem sempre gostei dos ditos “clássicos”, antes da faculdade a obra mais complexa que havia lido por fruição foi O Senhor dos Anéis. O gosto por Machado de Assis, Graciliano Ramos e Guimarães Rosa veio com a faculdade, com leituras orientadas e um amadurecimento meio forçado, mas muito valioso.

Mesmo tendo uma relação com o livro enquanto conteúdo, nunca refleti sobre a importância de uma boa tipografia, de uma boa impressão e de um design bem pensado. Em minhas reflexões, me deparei com o fato de que não se pode fazer um bom livro apenas com uma boa história, percebi a importância de um design que complete a obra, uma tipografia que também ajude a expressar e compor a obra e não pense somente na leiturabilidade e na legibilidade, de uma impressão que componha um elemento que aumente a imersão do leitor na obra e, por fim, um design bem pensado de um artista que conheça de fato a obra e seu autor, essa construção tem que resultar em uma verdadeira obra de arte, um livro que não é “apenas” uma boa história, mas uma experiência imersiva, algo que se possa saborear com vários sentidos.