“A luz que brilha com o dobro da intensidade brilha metade do tempo” – Tyrell (Blade Runner)
Gostaria de falar um pouco sobre a vida
de Álvares de Azevedo, um poeta do romantismo que gosto bastante porque, além
de ter sido importantíssimo na história da formação literária brasileira, era a
encarnação das concepções poéticas românticas.
Pra começar, gostaria de fazer uma
pequena introdução sobre o romantismo e sobre como esse movimento artístico
chegou ao Brasil. A escola romântica surgiu no século XVIII trazendo grande
mudança em relação à escola anterior, o neoclassicismo (ou arcadismo), a grande
diferença entre as duas nos é esclarecida por José Luís Jobim; “Enquanto no
Arcadismo havia uma atitude de seguir as normas neoclássicas, no Romantismo não
há preocupação em seguir nenhuma regra ou modelo anterior”, é perceptível que o
romantismo é extremamente marcado pelo rompimento com as normas e modelos
neoclássicos.
O romantismo chegaria ao Brasil no
início do século XIX, momento em que o país estava passando pelo
desenvolvimento da sua identidade nacional, intensificado pelo processo de
independência no ano de 1822. Daí surgiria toda uma geração de autores e intelectuais
brasileiros que transformaram o nacionalismo literário em um movimento,
influenciando o que o teórico literário José Emílio Major Neto definiria como a
“maturidade civilizatória” do país.
Falando finalmente de Alvares de Azevedo,
vale destacar que fora um dos maiores destaques do romantismo brasileiro.
Considero-o a encarnação das concepções poéticas tanto pela forma como viveu quanto
pela maneira que morreu, partira deste mundo prematuramente, a exemplo de
vários outros poetas de sua geração, vitimado pela tuberculose e atormentado pelas
constantes frustrações amorosas, altamente associadas a suas obras.
“O destino
trágico de Álvares de Azevedo mimetiza de maneira muito direta as concepções da
poética romântica sobre o artista como um ser marcado pelo infortúnio e pelo
destino trágico, ou seja, um ser assinalado por uma sensibilidade surpreendente
e incapaz de conviver com as contradições de um mundo cada vez mais indiferente
à poesia, e que faz do poeta um pária social.” (Citação de José Emílio
Major Neto, a íntegra pode ser conferida em um dos textos indicados ao fim do
artigo)
Foi um poeta que viveu duas fases, a
primeira angelical e pura, já a segunda foi devassa e boemia. A mudança se deve
grandemente ao seu envolvimento com a “Sociedade Epicuréia” durante o período
em que frequentou a faculdade de direito em São Paulo, que naquele momento era
o epicentro da atividade literária da época. A Sociedade Epicuréia foi um grupo
que reuniu estudantes de Direito paulistanos e foi composto por nomes como
Francisco Otaviano, Aureliano Lessa, Bernardo Guimarães, Álvares de Azevedo,
entre outros. (Calma, que ainda pretendo tratar da Sociedade Epicuréia com mais
cuidado em outro texto)
A mudança constituiu-se da substituição
do amor idealizado, amplamente visto no arcadismo pelo amor doentio, no caso de
Álvares de Azevedo, por vezes incestuoso quando se tratava de sua obsessão pela
mãe e a irmã, como o observa o teórico Moisés Massaud: “Substituem o amor-medo,
feminóide, pelo amor doentio, vicioso, fruto de neuroses ou de ‘paraísos
artificiais’”.
Que importa que
o anátema do mundo
Se eleve contra nós,
Se é bela a vida num amor imenso
Na solidão – a sós?
Se eleve contra nós,
Se é bela a vida num amor imenso
Na solidão – a sós?
Se nós teremos o
cair da tarde
E o frescor da manhã:
E tu és minha mãe, e meus amores
E minh’alma de irmã?
E o frescor da manhã:
E tu és minha mãe, e meus amores
E minh’alma de irmã?
(A. De Azevedo)
Essa mudança trouxe um clima altamente
depressivo para o poeta, mas por outro lado, esse segundo momento, altamente
byroniano e ultra-romântico, é um marco revolucionário em que aconteceu o
rompimento do autor com a tradição setecentista neoclássica.
Também se fez presente uma atmosfera
altamente fúnebre, ao mesmo tempo em que os jovens escritores tentavam fugir do
chamado “mal do século”, que nada mais era do que um pessimismo grave e
sensação constante de perda, um sentimento de tédio,
melancolia e sofrimento profundo sem causa aparente e que resultou na obsessão
do poeta pelo fim.
Tu foste como o
sol; tu parecias
Ter na aurora da vida a eternidade
Na larga fronte escita . . .
Porém não voltarás como surgias!
Apagou-se teu sol da mocidade
Numa treva maldita!
Ter na aurora da vida a eternidade
Na larga fronte escita . . .
Porém não voltarás como surgias!
Apagou-se teu sol da mocidade
Numa treva maldita!
(A. de Azevedo, “Um cadáver de
poeta”)
Qu’esperanças, meu Deus! E o
mundo agora
Se inunda em tanto sol no céu da tarde!
Acorda, coração!. . . Mas no meu peito
Lábio de morte murmurou: – É Tarde.
Se inunda em tanto sol no céu da tarde!
Acorda, coração!. . . Mas no meu peito
Lábio de morte murmurou: – É Tarde.
(A. de Azevedo, “Virgem Morta”)
Para mim, Álvares de Azevedo foi, de
fato, um poeta ímpar e essencial para a revolução que foi a escola do
romantismo no cenário nacional brasileiro, pois o mesmo viveu os seus preceitos
de tal maneira, que sua obra é interpretada por muitos como quase biográfica,
mas como viveu sua vida de forma intensa, acabou por falecer de maneira
prematura.
Quer
saber mais sobre o tema desse Devaneio Nerd? Confira as indicações!
AZEVEDO, Álvares de. Lira dos Vinte Anos e Poesias
Diversas. São Paulo. Ateliê Editorial. 1999.
AZEVEDO, Álvares de. Lira dos Vinte Anos e Poesias
Diversas. In: MOISÉS, Massaud. História da Literatura Brasileira, volume I. Romantismo.
São Paulo. Editora Cultrix. 2001.
FALBEL, Nachman. Os Fundamentos Históricos do
Romantismo. In: O Romantismo. GUINSBURG. J. Perspectiva, 1978.
JOBIM, José Luís. Introdução ao Romantismo:
Subjetivismo. Rio de Janeiro. Editora da UERJ. 1999.
MOISÉS, Massaud. História da Literatura Brasileira,
volume I. Romantismo. São Paulo. Editora Cultrix. 2001.
NETO, José Emílio Major. Apresentação e Notas. In:
AZEVEDO, Álvares de. Lira dos Vinte Anos e Poesias Diversas. São Paulo. Ateliê
Editorial. 1999.
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